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Conselheiro do Papa Francisco acredita que mulheres poderiam vir a ser sacerdotes

O Cardeal Hollerich declarou que não há certeza de que a doutrina escrita por João Paulo II na Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis, em 1994,  foi promulgada “de forma infalível”.

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Redação (29/03/2023 11:43, Gaudium Press) O Cardeal Jean-Claude Hollerich, arcebispo de Luxemburgo, membro do Conselho de 9 cardeais que auxiliam o Papa Francisco e relator-geral do Sínodo sobre a Sinodalidade, concedeu uma entrevista exclusiva ao semanário croata Glas Koncila, na qual tratou sobre ordenação de mulheres, a posição da Igreja em relação à homossexualidade, o papel das mulheres na Igreja e o “caminho sinodal” alemão.

O prelado jesuíta de 64 anos declarou que, no futuro, um papa poderia eventualmente permitir o sacerdócio feminino, questionando a infalibilidade e imutabilidade deste ensinamento.

“O Papa Francisco não quer a ordenação de mulheres, e eu sou totalmente obediente a isso. Mas as pessoas continuam discutindo o tema”, destacou Hollerich que questiona a posição tomada por João Paulo II, a qual determina que somente homens podem receber a Ordem sacerdotal. O papa polonês, canonizado em 2014, determinou ainda que este ensinamento não era passível de modificações futuras. Hollerich, no entanto, afirma que “com o tempo” um papa poderia ir contra o que João Paulo II escreveu na Carta Apostólica Ordinatio Sacerdotalis, em 1994. O cardeal diz que não há certeza de que esta doutrina foi promulgada “de forma infalível”.

João Paulo II, considerado conservador, escreveu que “a ordenação sacerdotal” foi “reservada apenas aos homens” e que isto foi “preservado pela Tradição constante e universal da Igreja”. O papa polonês escreveu ainda “que a Igreja não tem autoridade alguma para conferir a ordenação sacerdotal às mulheres” e isto “deve ser mantido definitivamente por todos os fiéis da Igreja”.

Sobre o veto da Igreja ao sacerdócio feminino, Hollerich afirmou: “Certamente é um ensinamento verdadeiro para o seu tempo, e não podemos simplesmente deixá-lo de lado. Mas acho que pode haver algum espaço para expandir este ensinamento – para ver qual dos argumentos do Papa João Paulo II poderia ser desenvolvido”. “É o Santo Padre quem deve decidir se as mulheres podem ser padres”, mas isto “não é uma opção para o Papa Francisco”.

Em novembro de 2022, em declarações à revista América, dirigida pelos jesuítas nos Estados Unidos, Francisco disse que “mulheres não podem ser ordenadas sacerdotes” porque “o princípio petrino não previa isso”. Segundo o papa argentino, o papel da mulher na Igreja é até “mais importante” que o ministério dos padres, e ressaltou que “nós (papas) ainda não desenvolvemos isso”.

Em posicionamento contrário às declarações do cardeal Hollerich, Francisco confirmou a posição doutrinal de João Paulo II em 2016, falando aos jornalistas em um voo papal. Ele ressaltou que “a palavra final é clara, foi dita por São João Paulo II e ela permanece”. Em outra ocasião, em entrevista à Reuters, Francisco abordou a possibilidade da ordenação de mulheres e voltou a citar o papa polaco: “João Paulo II foi claro e fechou a porta, não voltarei atrás nisso”.

Por sua parte, o Cardeal Jean-Claude Hollerich afirmou que não é um promotor da ordenação de mulheres, mas é favorável a que as mulheres tenham “mais responsabilidades pastorais”. Ele citou o exemplo de sua própria diocese de Luxemburgo onde as mulheres cuidam da formação dos fiéis e pregam até mesmo na Catedral, mas fora das missas.

Na entrevista ao semanário croata, Hollerich também expressou posições divergentes da doutrina tradicional católica em relação à homossexualidade, na linha do posicionamento recente dos bispos alemães que, desobedecendo ao Vaticano, aprovaram um ritual de bênçãos para casais do mesmo sexo. A decisão foi aprovada durante a assembleia final do Caminho Sinodal Alemão – numa sequência de reuniões entre bispos e leigos que já dura 3 anos e tem sido palco de propostas contrárias à doutrina católica, como a ordenação sacerdotal de mulheres, bênçãos de uniões homossexuais e homilias dadas por leigos em missas.

Hollerich afirmou que “quando o ensinamento da Igreja foi feito, o termo homossexualidade nem existia. Homossexualidade é uma palavra nova; mesmo na época de São Paulo as pessoas não faziam ideia de que poderia haver homens e mulheres atraídos pelo mesmo sexo”. “Como você pode condenar pessoas que não podem amar senão pessoas do seu mesmo sexo? Para alguns deles é possível ser casto, mas chamar outros à castidade é como falar egípcio para eles”, sublinhou o cardeal.

“Se dissermos que tudo o que eles (os homossexuais) fazem é intrinsecamente errado, equivale a dizer que a vida deles não tem valor. Muitos jovens vieram a mim e falaram comigo como quem fala com um pai sobre serem homossexuais… E o que um pai faz? Ele os joga fora ou os abraça incondicionalmente?”.

“Os homossexuais devem se sentir bem-vindos em nossa casa. Caso contrário, eles irão embora. O papa disse algo crucial sobre este tema. Eu o parafraseio: certamente, a homossexualidade é um pecado – como todo sexo fora do casamento é um pecado”.

Hollerich também acredita que o ensinamento sobre a homossexualidade no Catecismo da Igreja Católica, promulgado por João Paulo II em 1992, deve ser modificado.

“Acho a parte (do catecismo) que chama a homossexualidade “intrinsecamente desordenada” um pouco dúbia. Ainda assim, temos que acolher todas as pessoas e fazê-las sentir o amor de Deus. Se eles o sentirem, tenho certeza de que algo mudará em seus corações”, afirmou.

Por ser jesuíta e por sua posição proeminente no Vaticano, Hollerich é visto como um possível sucessor de Francisco, mas, suas posições favoráveis a mudanças doutrinais na Igreja têm encontrado resistências por parte de fiéis, bispos e cardeais da Igreja Católica.

Em um manuscrito publicado postumamente, o cardeal australiano George Pell acusou Hollerich de ser “herético” e que deveria ser corrigido. Pell faleceu em janeiro deste ano, após um procedimento cirúrgico que ele desejou realizar em Roma, e não na Austrália, por acreditar que um conclave era iminente. Seu manuscrito circulou entre os cardeais sob o pseudônimo “Demos”. Pell também qualificou o pontificado de Francisco como “catastrófico” e que o futuro papa deveria revisar temas promovidos no presente pontificado.

Um dos críticos de posições como as do cardeal Hollerich é o alemão Ludwig Müller, ex-Prefeito para a Doutrina da Fé, demitido por Francisco em 2017. Müller tem defendido a manutenção dos ensinamentos sobre o casamento e a homossexualidade, chegando a criticar o Papa Francisco ao afirmar que este permitia a “confusão” entre os católicos e que deveria “corrigir” ou “sancionar” bispos que promovem posicionamentos contrários à doutrina, em concreto, os participantes do Caminho Sinodal Alemão.

Entretanto, para o Cardeal Hollerich, a confusão não parece ser um problema. Com efeito, nesta entrevista, ele fez uma comparação: “o Pentecostes parecia uma grande confusão; as pessoas até pensaram que os apóstolos estavam bêbados! Foi só depois que a harmonia foi estabelecida. O Espírito Santo às vezes gera grande confusão para trazer nova harmonia”.

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