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O sal do convívio e a luz do bom exemplo

O convite à santidade, feito a todos os cristãos por Nosso Senhor, tem como corolário a obrigação de trabalharmos pela salvação de nossos irmãos, com a palavra e o exemplo de vida.

Jesus pregando

Redação (29/01/2023 10:18, Gaudium Press) A liturgia deste 4º Domingo do Tempo Comum colhe uma parte do famoso sermão da montanha, síntese de todos os ensinamentos evangélicos. Assim, contradizendo de modo frontal as máximas e os costumes vigentes em sua época, nas oito Bem-aventuranças, o Divino Mestre prega: “aos avarentos a pobreza, aos orgulhosos a humildade, aos voluptuosos a castidade, aos homens do ócio e do prazer o trabalho e as lágrimas da penitência, aos invejosos a caridade, aos vingativos a misericórdia e aos perseguidos as alegrias do martírio”.[1] Em suma, nelas está traçado o caminho da santidade, caminho esse que deve ser palmilhado por todos os fiéis.

O simples enunciado das Bem-aventuranças pressagiava uma renovação do mundo, o advento de uma nova civilização, de uma humanidade libertada. Enfim, algo que a História ainda não conhecera.

Logo depois de proclamá-las solenemente, Jesus vai Se dirigir sobretudo aos Apóstolos e discípulos, utilizando uma linguagem muito expressiva para lhes indicar as qualidades necessárias ao cumprimento de sua missão. E o faz diante de todos, de modo a tornar manifesta a obrigação daqueles mais chamados a guiar, ensinar e santificar os fiéis.

As características da missão dos discípulos

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: “Vós sois o sal da terra”. (Mt 5,13)

Foi o sal sempre muito apreciado e valorizado pela humanidade, por ser um bom conservante dos alimentos e por realçar o seu sabor. No Império Romano, o pagamento aos soldados era feito com ele ou também se destinava uma quantia em dinheiro para sua aquisição, originando o termo salário.

Ao afirmar: “Vós sois o sal da terra”, Nosso Senhor declara que seus discípulos — ou seja, todos os batizados — devem enriquecer o mundo propiciando um novo sabor ao convívio humano, evitando a brutalidade e a corrupção dos costumes.

“Vós sois a luz do mundo”. (Mt 5,14)

Confiando-nos a missão de sermos “a luz do mundo”, Jesus nos convida exatamente a participar de sua própria missão, a mesma que fora proclamada pelo velho Simeão no Templo, quando, tomando o Menino Deus nos braços, profetizou que Ele seria “luz para iluminar as nações” (Lc 2,32). Nosso Senhor veio trazer a luz da Boa-nova e do modelo de vida santa.

A doutrina ilumina e indica o caminho, enquanto o exemplo edificante move a vontade a percorrê-lo. Neste mundo imerso no caos e nas trevas, pela ignorância ou pelo desprezo dos princípios morais, os discípulos de Jesus devem, com o auxílio da graça e o bom exemplo, iluminar e orientar as pessoas, ajudando-as a reavivar a distinção entre o bem e o mal, a verdade e o erro, o belo e o feio, apontando o fim último da humanidade: a glória de Deus e a salvação das almas, que acarretará o gozo da visão beatífica.

Para que isso se concretize, a condição é sermos desprendidos e admirativos de tudo o que no universo é reflexo das perfeições divinas, de modo a sempre procurarmos ver o Criador nas criaturas. Assim, nossas cogitações e nossas vias terão um brilho proveniente da graça.

Expressiva figura dessa realidade espiritual nos é proporcionada pela lâmpada elétrica incandescente. O tungstênio é, em si, um elemento vil e de escassa utilidade. No entanto, perpassado pela corrente elétrica e em uma atmosfera na qual o ar foi substituído, ele ilumina como nenhum outro metal.

A eletricidade representa a graça divina, enquanto a debilidade do tungstênio bem simboliza o nosso nada. A necessidade de certo vácuo para a incandescência do filamento ressalta ainda mais como, para refletirmos a luz sobrenatural, precisamos reconhecer com alegria o nosso vazio, o nosso pouco mérito, as nossas limitações e faltas, e não opor nenhuma resistência à ação de Deus. Deste modo, como filamentos de tungstênio ligados à corrente da graça, poderemos ser transmissores da verdadeira luz para o mundo.

Não tenhamos medo de praticar a virtude

“Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos Céus”. (Mt 5,16)

Como lâmpadas a reluzir na escuridão, Nosso Senhor quer que os cristãos iluminem os homens com suas boas ações. Isto é, o bem precisa ser proclamado sem respeito humano e aos quatro ventos, num mundo que estadeia a luxúria e o ateísmo. Ao se encontrar em um ambiente hostil, o bom muitas vezes tende a se encolher, a se intimidar, quase se desculpando por não ser dos maus… o que é absurdo! Pelo contrário, devem a verdade e o bem gozar de plena cidadania, onde quer que seja.

Por isso, é necessário não ter receio de proclamar por toda parte a nossa Fé, a nossa vocação, a nossa determinação de seguir a Cristo. Expressivo nesse sentido é o célebre episódio da vida de São Francisco de Assis, ao convidar frei Leão para acompanhá-lo a uma pregação. Os dois simplesmente andaram pela cidade, imersos em sobrenatural recolhimento, e retornaram ao convento sem dizer uma palavra. Ao ser indagado acerca da pregação, o Santo respondeu ter ela sido realizada pelo fato de dois homens se mostrarem de hábito religioso pelas ruas, guardando a modéstia do olhar.[2] É o apostolado do bom exemplo.

Enfim, cabe a nós todos, por meio de palavras, atos, ou da mera ação de presença, procurar salgar e iluminar essa terra tão insossa e escura.

 Por Jerome Siqueira

Extraído, com adaptações, de: CLÁ DIAS, João Scognamiglio. O inédito sobre os Evangelhos: comentários aos Evangelhos dominicais. Città del Vaticano-São Paulo: LEV-Instituto Lumen Sapientiæ, 2013, v. 2, p. 56-69.


[1] BERTHE, Augustin. Jesus Cristo, sua vida, sua Paixão, seu triunfo. Einsiedeln: Benziger, 1925, p. 144.

[2] Cf. AFONSO MARIA DE LIGÓRIO. La dignidad y santidad sacerdotal. La Selva. Sevilla: Apostolado Mariano, 2000, p. 306.

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