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Duas conversas, duas eras históricas

A Solenidade da Anunciação do Senhor celebra a maior divisão da História: antes de Cristo e depois de Cristo. Duas eras históricas. Cada uma iniciada por uma conversa entre um representante do gênero humano e um Espírito Angélico.

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Redação (25/03/2021 09:28, Gaudium Press) Em meio aos violáceos tons do tempo litúrgico da penitência, irrompe com luminoso fulgor a solenidade da Anunciação do Senhor. Assim, ao mesmo tempo que a liturgia sugere aos fiéis atos de penitência por suas faltas ao longo da Quaresma, também lhes transmite certa consolação ao ver, no anúncio do Anjo à Santíssima Virgem, a falta de nossos primeiros pais reparada e restabelecida a “harmonia do Universo”.

A tradição e a mística narram que, em sua vida terrena, Nossa Senhora tomou conhecimento do episódio em que “o mais astuto de todos os animais” entrou no Paraíso Terrestre e estabeleceu um diálogo com Eva. Ela se indignou e, de alguma forma, quis repará-lo diante de Deus.

Assim, o paralelismo entre o diálogo de Eva com a serpente e o colóquio da Santíssima Virgem com o Arcanjo Gabriel torna-se patente: dois espíritos angélicos, duas virgens, duas conversas, duas eras históricas…

Aquela que Adão chamou “mãe de todos os viventes”, gerou a morte no mundo e causou a expulsão do Paraíso. A Eva da Nova Aliança foi digna de ser “foi o paraíso terrestre do novo Adão”[1] e gerou a vida divina em si.

Podemos, sem dúvida, afirmar que os rumos da História passaram pelas mãos de Eva e Maria. Uma gerou a Antiga Aliança; outra, o “Sangue da Nova e Eterna Aliança”.

A “Era de Eva”

Tudo transcorria perfeitamente no Paraíso até que nossos primeiros pais, postos à prova, prevaricaram. Eva consentiu na vil proposta da serpente e convenceu o marido a se banquetear da iguaria proibida (Cf. Gn 3, 1-7).

O Antigo Testamento vem marcado pelas consequências desta conversa…

Já entre os primeiros filhos de Eva encontramos um fratricida (Cf. Gn 4, 8), o sangue derramado por Abel é a primeira demonstração da maldade humana, ora contínua, ora oscilante, ao longo da História.

Pouco depois, deparamo-nos com oito pessoas flutuando sobre águas infindas, salvas dentro de uma arca, pois apenas um homem foi achado justo na terra (Cf. Gn 5–7).

Em seguida, uma pérfida torre se ergue para desafiar a Onipotência Divina. Confusão, dispersão mundial (Cf. 11, 1-9); e ainda duas cidades dignas do fogo do céu (Cf. 19, 24-25).

Vemos depois, cambaleante pelo deserto, uma multidão recém-constituída, revoltada, entre murmurações e idolatrias, contra o Aquele que a salvara não só das águas, mas do fardo da escravidão.

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Enfim, quantos vai-e-vens o Antigo Testamento conheceu por causa de um diálogo…

A mudança

A transição da “Era de Eva” para a “Era de Maria” dá-se com outra conversa e outra concessão: um “fiat”.

Alguns milênios após a primeira Eva aceder à serpente, “foi enviado por Deus o Anjo Gabriel a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão, que se chamava José, da casa de David; o nome da Virgem era Maria” (Mt 1, 26-27)

Outro Espírito Angélico entra na história e faz nova promessa a uma Virgem: “eis que conceberás no teu ventre, e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus. Este será grande, e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai David; e reinará sobre a casa de Jacob eternamente; e o seu reino não terá fim” (Mt 1, 31-33). E ainda: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. E, por isso mesmo, o Santo, que há-de nascer de ti, será chamado Filho de Deus” (Mt 1, 35)

Uma promessa talvez superior à da serpente: À Virgem Humilde não foi prometido ter os olhos abertos. Para que abrir os olhos estando coberto pela sombra do Paráclito? Não lhe foi prometido ser “deusa”, mas Mãe do único Deus Verdadeiro. Até mesmo o fruto da árvore de vida, que a serpente nem mencionou, Deus concedeu a Maria quando lhe diz, pelo Anjo, que o reinado de seu Filho não terá fim.

Pode-se dizer que o que a serpente promete não se cumpre, mas o que Deus pede que lhe doemos, Ele mesmo retribui cem vezes mais.

A “Era de Maria”

Este colóquio gera um regime de graças novo, um período histórico novo. O Novo Testamento é marcado pelas consequências da primeira conversa, mas sobretudo da segunda:

O Filho gerado por Maria é Deus e Homem, morre numa cruz, “dá a vida por seus irmãos”; o sangue derramado por Nosso Senhor marca a infusão de graças do Novo Testamento.

Pouco depois, deparamo-nos com doze apóstolos pregando por terras infindas.

Em seguida, acirradas perseguições surgem desafiando a Onipotência do Crucificado. Dispersão dos Cristãos na terra, aglomeração de mártires no céu.

Quando os Cristãos adquirem cidadania, vemos a ortodoxia ameaçada por heresias, mas socorrida pelos concílios.

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Finalmente, dois milênios depois, eis-nos aqui. Que observamos? Uma humanidade marcada pelo anúncio da “Nova Aliança” ou pelas falsas promessas da antiga serpente?

Claro está que o Preciosíssimo Sangue – da “Nova e Eterna Aliança” –, não pode ter sido derramado em vão. Possuindo um valor infinito, não há prodígios que lhe sejam impossíveis. As promessas de Fátima parecem também indicar que o auge da “Era de Maria”, o triunfo de seu coração e os melhores frutos deste Sangue Divino estão ainda por vir.

Aproveitemos os últimos dias da Quaresma, com inabalável confiança e joelhos por terra, implorando ao Divino Redentor graças inauditas para nossos dias.

Por Fernando Mesquita


[1] MONTFORT, Luís Maria Grignon de. Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem. Monfortinas, 2001, p. 13.

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