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O Natal é uma poderosa lição para nós

O homem orgulhoso busca sem descanso o domínio sobre todos os seres que o cercam, chegando ao extremo de se fazer adorar

Fra Angelico natal

Redação (30/12/2020 11:14, Gaudium Press) Desde a saída de nossos primeiros pais do Paraíso, o orgulho humano — vício traiçoeiro e insaciável, paralelo ao non serviam de Lúcifer — sempre teve dificuldade de tolerar uma autoridade sobre si.

Quando de todo consentido, leva sua vítima, num primeiro lance, a desejar uma absoluta igualdade na distribuição dos bens, condições de existência, dons, etc.

E ladinamente esconde atrás de si o desejo de ser deus, rei da criação, e de dispor desta ao seu bel-prazer. Por isso o homem orgulhoso busca sem descanso o domínio sobre todos os seres que o cercam.

O delírio de ser igual a Deus, raiz da ruína humana

Essa ambição insensata, repercutindo o grito de revolta no Céu Empíreo, foi a causa do primeiro pecado sobre a terra. A serpente não encontrou melhor argumento para levar Eva à desobediência do que prometer-lhe a igualdade com Deus: “E sereis como deuses…” (Gn 3,5). Atraída por tão grande promessa, Eva não hesitou.

Percebe-se, pela descrição do Gênesis, que dentro da alma ainda inocente da mãe do gênero humano, o sonho de ser “como deus” despertou forte apetência. Eis aí a recôndita origem de nossa descida a esta terra de exílio.

Não tardou muito para Deus ver “que a maldade dos homens era grande na terra, e que todos os pensamentos do seu coração estavam continuamente voltados para o mal” (Gn 6, 5).

Mas o dilúvio não corrigiu a humanidade: em pouco tempo, o homem quis construir uma torre que atingisse o céu. E nem sequer o castigo da confusão das línguas foi suficiente para cauterizar o delírio de ser igual a Deus.

Tanto em Roma quanto na Pérsia, como na Síria, não faltaram tiranos que se fizessem adorar, construindo templos para obrigar seus semelhantes a lhes prestarem culto de latria.

Se tempo e espaço não nos faltassem, poderíamos fazer desfilar, em incontáveis páginas, as insensatezes cometidas pelos homens ao longo da História, em busca dessa usurpação do trono de Deus.

Mas não é necessário remontarmos ao passado distante para analisar essa insensata tendência. Basta abrirmos os jornais ou revistas, ligarmos a TV ou o rádio, ou entrarmos em algum ambiente de hoje em dia para avaliarmos uma das principais causas da impiedade hodierna.

Os homens vivem como se Deus não existisse; o ateísmo prático tomou conta da face da terra. Embora pouca gente afirme que não acredita em Deus, nega-se — através dos sistemas de vida, dos modos de ser e dos costumes — a existência d’Ele. Perdeu-se o senso do ridículo relativo ao auto-elogio.

Onde encontrar alguém que só fale de si raramente? A egolatria atingiu extremos inimagináveis: a repetição do “eu… eu… eu…” é o centro de todas as conversas e preocupações. Assistimos de mãos atadas ao enterro de todo e qualquer idealismo, dos valores mais altos.

É por isso que a mesma frustração que se generalizou por ocasião do dilúvio, ou após a decepção causada pela malsucedida Torre de Babel, percorre a humanidade deste terceiro milênio, levando a prognosticar que, por exemplo, a depressão nervosa se tornará a doença mais comum dentro em breve.

Constará nos anais da História que todos os males de nossa atual existência se devem ao fato de os homens não terem querido dobrar os joelhos diante de Deus, por desejarem ardentemente ocupar seu trono.

Modo de aplacar nossa sede de infinito

Para cortar pela raiz os pecados que hoje por toda parte se cometem, bastaria as almas se tornarem receptivas à mensagem que, de dentro das palhas do Presépio, nos traz o Menino-Deus.

A sede de infinito arde em chamas dentro de nossa vontade, mas não há repouso verdadeiro para nós fora de Deus, como afirmava Santo Agostinho. E foi Ele próprio quem criou esse anseio, para nos facilitar a procura do Absoluto.

Entretanto, jamais conseguiremos atingir essa plenitude, à qual tão fortemente aspiramos, se estivermos apoiados exclusivamente em nossas forças.

É um paradoxo, diria alguém. Por que terá querido Deus acender labaredas de desejos irrealizáveis em nossos pobres corações, uma vez que não temos meios para realizá-los? Tratar-se-á de uma atitude pouco ou nada paternal d’Ele?

Jamais! Deus é a Bondade em substância. Ele quer muito nos fazer “deuses”… não através de uma orgulhosa e igualitária revolução de nossa parte, mas por meio da humildade, submissão e amor.

Essa difusão exuberante do bem, nós a constatamos até na própria obra da criação. O sol não se cansa de nos enviar seu calor; as águas de nos fornecerem os peixes; a terra, seus frutos, etc. E sempre de forma superabundante. São seres minerais, vegetais, animais que, se fossem passíveis de felicidade, exultariam de entregar-se ao serviço dos homens.

E esse não é senão um pálido reflexo da infinita bondade do Criador, que para resgatar-nos do pecado e reconciliar-nos com Ele, resolveu que seu Verbo Se encarnaria, entregando sua vida até a última gota de sangue: “E o Verbo Se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14).

Eis aí a solução de um problema de milênios: Deus realiza o que por nossas puras forças era impossível. Jamais poderíamos nos igualar a Deus por nossos próprios meios, por isso Ele mesmo se reveste de nossa carne e nasce Divino Infante: Deus é Homem, e, n’Ele, o homem é Deus!

Aceitemos com entusiasmo o convite que Ele nos faz, amemos a perfeição, abracemos a via da santidade e sejamos tais como Ele é para podermos, assim, gozar da felicidade eterna.

Mons. João Scognamiglio Clá Dias, EP.

Texto extraído, com adaptações da Revista Arautos do Evangelho n.48, dezembro 2005.

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