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Amizade: corrente de ouro entre os homens e Deus

O corretivo para tantas atitudes ilógicas da civilização moderna está muitas vezes ao nosso lado e ao nosso alcance: numa preciosa amizade.

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Redação (30/06/2020 12:37, Gaudium Press) Apesar de ainda estar preocupado com a instabilidade na qual estamos vivendo, decidi tomar um uber com vistas a ir até ao centro da cidade: tinha muitos trabalhos atrasados, combinações pendentes, encomendas prejudicadas… enfim, era algo já indispensável.

Receoso de esperar muito tempo até chegar minha condução, pensava. Tão logo entrei no veículo, meus olhos caíram num caderno escolar esquecido no assento de trás. Pedi licença ao motorista para folhear a brochura – aliás, o condutor sequer tinha se dado conta do olvido cometido por algum de seus clientes. Abri. Ali havia de tudo: traços desconexos, desenhos não muito artísticos, frases… enfim, os passatempos de algum aluno imaginativo durante as aulas.

Entretanto, algo chamou-me a atenção: três linhas escritas em sentido diagonal, com letra grande: “Parentes, tenho alguns. Conhecidos, são muitos. Amigos mesmo, nenhum”. Pobre aluno! Pensei. Quantos como ele haverá por esse mundo afora, procurando, sem encontrar, uma boa, forte e leal amizade, que os ajude a sustentar os combates da vida, muitas vezes tão duros já desde a jovem idade?

Rezei por ele e, ao fechar o caderno, lembrei-me daquela belíssima passagem da Escritura, citada por São Francisco de Sales em sua famosa Introdução à vida devota: “Um amigo fiel é uma poderosa proteção; quem o achou, descobriu um tesouro. Nada é comparável a um amigo fiel; o ouro e a prata não merecem ser postos em paralelo com a sinceridade de sua fé. Um amigo fiel é um remédio de vida e imortalidade”. (Eclo 6, 14-15)

Amizade! Esse tesouro que tantos procuram alhures, onde pode verdadeiramente ser encontrado? “Amicus certus, in hora incerta, cernitur” [1], reza o provérbio latino. Com efeito, a solidez da boa amizade vem do fato de estar baseada em razões de ordem sobrenatural – e por isso, frequentemente, é achada num momento de dificuldade, quando um se dispõe a doar-se e a sofrer pelo outro. Une-os o mesmo ideal e o mesmo desejo de perfeição.

Quem é meu verdadeiro amigo?

Quando os amigos se estimam por estes motivos, a coesão entre eles se torna vigorosa, quase indestrutível. Quem o afirma é o próprio São Francisco de Sales: “Se a causa de tua amizade for a religião, a devoção e o amor de Deus, (…) ah! então tua amizade é preciosíssima. É excelente, porque vem de Deus; excelente porque Deus é o laço que a une; excelente, enfim, porque durará eternamente em Deus.

“Não falo, pois, aqui simplesmente do amor cristão que devemos a nosso próximo, todo e qualquer que seja, mas aludo à amizade espiritual, pela qual duas, três ou mais pessoas se comunicam entre si as suas devoções, bons desejos e resoluções por amor de Deus, tornando-se um só coração e uma só alma (…)

“Todas as outras amizades são como a sombra desta e os seus laços são frágeis como o vidro. Porém estes corações felizes, unidos em espírito de devoção, estão presos por uma corrente toda de ouro”. (Introdução à vida devota, parte III)

“Um irmão apoiado por outro irmão é como uma cidade fortificada, construída no alto; é firme como um palácio edificado sobre sólidos alicerces” (18, 19), afirma o Livro dos Provérbios.

Fruto da amizade, a única esperança da vida é a gratidão

Portanto, em meio aos muitos traços desconexos, rabiscos não artísticos e ilógicas atitudes que compõem nossa aviltada “civilização” moderna, por que não procurarmos o indispensável apoio de que necessitamos mais próximo de nós, ao nosso lado, num amigo?

A caridade entre os verdadeiros amigos os dispõem a todas as dedicações e todos os sacrifícios. Desejar com ardor cumprir as palavras pronunciadas por nosso Divino Salvador antes de partir para a Paixão – “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos”. (Jo 15, 13) – será certamente o “remédio de vida” mais eficaz para curar tantas doenças de almas que se espalham mais depressa que qualquer vírus, em nossos dias.

Pois a única esperança da vida é a gratidão!

Por Bonifácio Silvestre

[1] O amigo certo, na hora incerta, discerne-se.

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